© Foto: Leonardo Benassatto/Reuters |
Leonardo Augusto
Candidato à Presidência
derrotado pelo PDT em 2018, o ex-ministro Ciro Gomes afirmou
que o “campo progressista” perderá as próximas três ou quatro eleições caso o
que ele chama de “burocracia do PT” mantenha uma estratégia em “nome da direção
imperial” do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, cresceu entre
políticos e analistas a percepção que Ciro decidiu radicalizar o discurso de
defesa da democracia e romper com a “frente de esquerda”. “Agora ninguém mais
vai enganar ninguém porque o que eu tinha para dar de engolir, de ter que fazer
silêncio em nome da unidade, eles acabaram de liquidar”, disse Ciro ao Estado.
Ele esteve em Belo Horizonte
para participar da filiação ao PDT da professora Duda Salabert, a primeira
transexual a se candidatar ao Senado, nas eleições do ano passado – ela estava
sem partido desde que se desfiliou do PSOL. Abaixo, os principais trechos da
entrevista, feita por telefone.
O deputado Alexandre
Frota lhe pediu desculpas sobre comentários que fez contra o
senhor. O pedido foi aceito?
Não vou atribuir nenhuma
relevância política a isso. Mas eu aceito as desculpas e reconheço nisso um
gesto humano muito nobre. Porque eu, quando erro, gosto também de pedir
desculpas. Aceito as desculpas dele e bola para frente.
O PT não apoiou o sr. na
eleição presidencial de 2018 e lançou um candidato próprio. Agora, o sr. já se
colocou como candidato para 2022. O sr. acredita que o PT pode, na próxima
eleição presidencial, apoiar um candidato de outro partido?
O PT são vários PTs. E é
importante que você entenda essa premissa para o raciocínio que vou elaborar.
Esta burocracia do PT e a estratégia que essa burocracia está fazendo em nome
da direção imperial do Lula é certeza da derrota do campo progressista no
Brasil agora e pelas próximas três ou quatro eleições. Por quê? Porque você
explodiu sobre a cabeça do povo brasileiro, tal como nosso povo é, dois
gravíssimos problemas. Um, a corrupção generalizada. Você pode relativizar,
como petista fanático dessa burocracia faz. A segunda questão é econômica (a
crise).
Ambos os lados agem da mesma
maneira?
São rigorosamente as duas
faces da mesma moeda. E aí você vê na caricatura. O Datafolha publica
uma pesquisa em que há uma violenta deterioração da popularidade do Bolsonaro,
e o Bolsonaro faz um discurso dizendo, ‘tá bom, errei em alguma coisa’, mas se
vocês falarem mal de mim, o PT vai voltar. No mesmo dia, a (presidente do PT) Gleisi
Hoffmann, que interpreta esse PT corrupto e incompetente, que é uma pau
mandado do Lula, sem nenhum tipo de atitude crítica, simplesmente o partido
mais importante do País é dirigido por essa mulher. Ela diz o quê? Que vai ser
nós contra o Bolsonaro. Enquanto isso alguém ilude o Flávio Dino, alguém
fala em unidade comigo, e tal.
Algum partido já conversou
novamente em unidade com você? Alguém do PT?
Comigo unidade é o cacete.
Unidade é na luta. E na luta em cima da mesa. Agora ninguém mais vai enganar
ninguém porque o que eu tinha para dar de engolir, de ter que fazer silêncio em
nome da unidade, eles acabaram de liquidar.
Quando isso foi liquidado,
na eleição do ano passado?
Quando entregaram o Brasil
para o Bolsonaro. Ou você acha que o Bolsonaro se elegeria sem o que o PT fez?
O Bolsonaro nunca foi o candidato da direita brasileira. O Bolsonaro foi
engolido pela direita brasileira porque era o cara que foi identificado pelo
nosso sofrido povo como o mais tosco intérprete do antipetismo que era a força
dominante. Bolsonaro interpretou de forma tosca o sentimento de medo do povo.
Porque também durante 14 anos não mexemos uma linha nas instituições para
enfrentar o narcotráfico, o contrabando de armas, as facções criminosas
comandando o crime. E a única política que foi implantada no Brasil foi a
política do encarceramento do jovem pobre, negro.
Existe alguma possibilidade
de o presidente Jair Bolsonaro não terminar o governo?
Acho que ele não termina o
governo. Isso é um mero palpite. Espero que não seja pelo suicídio. Meu palpite,
é um mero palpite, é que vai ser por renúncia. Os políticos, que de alguma
forma foram negados também pelo caráter antipolítico que o Bolsonaro impôs na
retórica dele, estão muito ressabiados com a bobagem que fizeram no impedimento
da Dilma. Então, por exemplo, o PSDB sabe que talvez tenha se liquidado
mortalmente naquele gesto burro. Se tivesse esperado o tempo fluir, até o final
do mandato ruidoso da Dilma, tinha ganho as eleições. O que aconteceu,
interromperam o mandato e passaram a ser corresponsáveis pelo desastre que veio
daí adiante com Michel Temer e agora com o Bolsonaro. Produziram o
Bolsonaro. Isso o PT também está vendo. Então a probabilidade de um impeachment
hoje é pequena. Mas as energias são tão negativas e tão rápidas que não vejo
como Bolsonaro termine o governo.
O que vai ser mais fácil na
sua campanha em 2022, atrair apoiadores do Bolsonaro ou do PT?
Quero produzir corrente de
opinião. O Brasil vai passar por muita confusão. Acho que o Brasil vai passar
por momentos terríveis nos próximos seis meses. O cenário internacional está se
deteriorando de forma grave. O nível de paciência do Paulo Guedes para
as irracionalidade do Bolsonaro, e para a orgânica contradição do Bolsonaro com
o liberalismo que o Guedes representa, tudo isso provavelmente
sinaliza para uma saída do Guedes em algum momento. A deterioração da economia
é um fato. O teto de gastos será atingido no ano que vem. O Bolsonaro votou a
favor disso. É uma aberração. O ano que vem vai ser terrível. E isso tem um
poder de combustão muito grande. De provocar novos alinhamentos na vida
brasileira. Como eu calculo? Acho que o bolsonarismo doente são 15% da
população. Acho que o petismo doentio são 20% da população. E o grande problema
é que essa grande maioria (65%) está atomizada, sem compreensão.
O senhor veio a Belo
Horizonte para participar da filiação ao PDT da professora Duda Salabert, a
primeira transexual a se candidatar ao Senado, nas eleições do ano passado. Há
uma tentativa de o partido se aproximar das chamadas minorias?
A professora Duda é uma
figura extraordinária. Ela está saindo do PSOL. E escolheu o PDT. Isso
para mim é uma grande honra. E, para nós, não é para reforçar luta identitária,
é para reforçar a
militância em torno de um
projeto nacional que tenha compromisso com as diferenças, com a tolerância, com
a igualdade, trabalhar para que seja respeita a fé, a preferência dessa ou
aquela forma de amar, porque para nós todas elas são justas.
Nenhum comentário:
Postar um comentário