10/30/2014

Estação Cocal

Plebiscito, Referendo ou Iniciativa Popular

29/10/2014 • 14:14
Por Miguel Dias Pinheiro* 

Tão logo foi reeleita, a presidente Dilma Rousseff sinalizou para uma discussão de imediato sobre a reforma política no Brasil, cumprindo, assim, uma proposta de campanha, com o discurso de que pretende levar o tema para uma decisão ampla da própria sociedade civil organizada através de um plebiscito.

A reação, no entanto, foi imediata do presidente do Congresso Nacional, senador Renan Calheiros, discordando da tese da presidente e, de pronto, opinando pela possibilidade de um referendo, por ser ato mais simples via consulta popular.

Ainda que contrariada, em entrevista à imprensa Dilma admitiu concordar com o referendo, desde que todos defendam uma consulta popular. “Seja na forma de referendo ou plebiscito. Eles deságuam em uma Assembleia Constituinte. Acho muito difícil não ser uma discussão interativa. Não sei a forma que vai ser, mas acho difícil não ser com consulta popular” – disse.

A sociedade precisa saber qual é a diferença entre plebiscito e referendo. Ninguém até agora explicou isso às claras para o povo, que fica sem entender o sentido das palavras. Segundo a definição do próprio Tribunal Superior Eleitoral (TSE), “plebiscito e referendo são consultas ao povo para decidir sobre matéria de relevância para a nação em questões de natureza constitucional, legislativa ou administrativa. No plebiscito, o povo é convocado antes da criação do ato legislativo ou administrativo de que trata o assunto em pauta. No referendo, ele é convocado posteriormente, após a aprovação de uma lei, por exemplo, pelo Congresso Nacional, cabendo ao povo ratificar ou rejeitar a proposta legislativa”.

Em palavras mais fáceis ao entendimento leigo, no plebiscito o povo participa diretamente da reforma política, da formulação da lei, dizendo, por exemplo, como quer que funcione o processo político-eleitoral no país, a forma das eleições majoritárias e proporcionais, sobre a existência ou não de coligações partidárias, a forma do voto, etc, etc. No referendo, o Congresso elabora uma lei colocando para a sociedade aprovar ou não a reforma política, ou seja, tudo vem já pronto pelos parlamentares.

Plebiscito significa uma manifestação direta da vontade do povo que delibera e vota sobre um determinado assunto. No referendo, o povo delibera e vota sobre uma proposta formatada por uma conjuntura governativa, correndo-se o risco de que o país não possa alcançar as alterações profundas na estrutura do regime político vigente como almeja a sociedade.

O referendo só cabe para algo que já existe. O plebiscito funciona justamente o contrário, aprovando o que não existe. Enquanto no plebiscito permite-se uma legitimidade popular na raiz da questão, no nascedouro, no referendo a possibilidade de um disfarce é muito forte porque a lei vem do próprio Congresso Nacional para ser aprovada ou não com a chancela do voto popular.

A meu ver, referendo é reforma “meia sola”, como foi aquele que aprovou o famigerado desarmamento, cuja lei armou e protegeu o bandido e desarmou e desprotegeu o cidadão.

Penso que nem plebiscito e nem referendo devem atingir os anseios populares do momento político atual. Nem tampouco trazer resultados práticos para esse alvoroço da reforma política. Acho que a melhor saída seria o governo alentar uma consulta para que a sociedade apresente uma Proposta de Iniciativa Popular. Que nada mais é do que o direito que o cidadão brasileiro tem de apresentar projetos de lei para serem votados e eventualmente aprovados pelo Congresso Nacional. Relembre-se, pois, do projeto de lei de iniciativa popular mais recente no país, o da Ficha Limpa, que através de uma pressão da população fez com que o Congresso votasse e aprovasse uma das legislações mais importantes dos últimos tempos no Brasil, impondo aos candidatos um passado limpo, um histórico de probidade.

A Constituição Federal exige para o procedimento da Iniciativa Popular uma adesão mínima de 1% do eleitorado nacional, mediante assinaturas distribuídas por pelo menos 5 unidades federativas e no mínimo 0,3% dos eleitores em cada uma dessas unidades. Cumpridas as exigências constitucionais, o projeto é encaminhado ao Congresso Nacional para discussão.

Como propostas, então, para a reforma política, desde já a sociedade poderia começar a discutir e pressionar para os seguintes temas:

01. voto facultativo, voto distrital misto e lista mista, composta por voto direto dos filiados do partido;
02. extinção do foro privilegiado e da imunidade processual;
03. fim do financiamento de campanhas exclusivamente com recursos públicos; 
04. fim das coligações;
05. criação do voto vinculado;
06. proibir a divulgação de pesquisas eleitorais; 
07. reduzir a quantidade mínima de assinaturas para apresentação de projeto de iniciativa popular;
08. realização de CONSULTAS POPULARES para revogar mandatos (PLS nº 269/2005 e 82/2003 em tramitação no Congresso Nacional);
09. princípios mínimos obrigatórios em estatutos e regimentos internos dos partidos: democracia interna transparência;
10. prazo mínimo de 5 (cinco) anos de filiação para concorrer a cargos eletivos; votação interna para concorrer a eleições;
11. divulgar na internet despesas de campanha: data, hora, cidade, UF, CNPJ/CPF, nome recebedor, finalidade, valor, etc;
12. implementar a revogação e o veto popular (PEC 80/2003 em tramitação no Congresso Nacional);
13. fim do voto secreto no legislativo;
14. extinção do voto de liderança;
15. regulamentar o formato dos debates entre candidatos;
16. reduzir a quantidade mínima de assinaturas para apresentação de Projeto de Iniciativa Popular;
17. mandatos de 5 (cinco) anos;
18. quebra automática de sigilo (fiscal, bancário e telefônico) a partir do registro de candidatura a qualquer cargo eletivo (PEC 42/2007 em tramitação no Congresso Nacional);
19. quebra automática de sigilo (fiscal, bancário e telefônico) a partir da posse em cargo público eletivo ou de livre provimento;
20. mecanismos rigorosos e eficazes sobre fidelidade partidária;
21. divulgação na internet de declarações de renda e patrimônio dos ocupantes a cargos públicos eletivos e de livre provimento.

*advogado

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